quinta-feira, 21 de junho de 2012

Homem vive há 30 anos no meio de canavial na zona rural de Capivari, SP

 

Segundo moradores da região, idoso perambula pela área durante todo dia.
"Isolamento é difícil, pois o sistema capitalista não permite", diz socióloga.

Do G1 Piracicaba e Região

 

Idoso vive há cerca de trinta anos em canavial de Capivari  (Foto: Luiz Felipe Leite/G1)Idoso que vive há cerca de 30 anos em canavial dorme em um 'ninho' (Foto: Luiz Felipe Leite/G1)

Um homem sem nome, de origem desconhecida e, aparentemente, sem rumo. Também não se sabe a idade de Biliteco, como é chamado, que vive há 30 anos no meio de uma plantação de cana-de-açúcar em Capivari (SP), na região de Piracicaba (SP). No local, apenas uma colcha de retalhados, coberta com lona plástica, serve de cama, faça chuva ou sol.

Vestido com um paletó azul marinho e calça verde desbotados, o homem usa um chinelo de cada cor (rosa e azul) nos pés. O chapéu cinza compõe o vestuário e o rosto calejados. O figuro ainda conta com saco e guarda-chuva velhos. Ele não sabe ao certo há quanto tempo vive na área, mas moradores de um sítio próximo do canavial garantem que o eremita 'reside' no local há três décadas.

Veja galeria de fotos de Biliteco no canavial

Saga pelo andarilho
Também chamado de ermitão, o homem vive perambulando entre as plantações de cana-de-açúcar. Foram duas horas e meia para que a reportagem do G1 Piracicaba e Região pudesse achar o senhor que, muito amistoso, soube responder poucas perguntas. Ele não sabia ao certo de onde vinha, como se alimentava etc. A maioria das falas é desconexa. Questionado se gostava de morar na área, a resposta foi: “tudo irá acabar”, em tom profético.

Homem vive em canavial em Capivari (Foto: Luiz Felipe Leite / G1)'Ninho' onde homem dorme faça chuva ou sol, em
Capivari (Foto: Luiz Felipe Leite / G1)

Colcha e lona no 'ninho'
O local onde ele dorme, no meio do canavial, tem apenas palha e uma colcha de retalhos  cobertas por uma lona azul. Há pedaços de cana sobre a 'cama', usados como peso para evitar que o vento a leve. Ele possui ainda poucos pertences: dois chapéus e fumo. “É aqui onde fico. O pessoal da casa (moradores do sítio) me ofereceu outro lugar para ficar, mas não quero. Lá não vale nada”, afirmou o eremita.

Talvez seja nordestino
Em um dos poucos momentos de possível lucidez, o homem relatou que veio do Nordeste quando tinha 16 anos para trabalhar em uma plantação de algodão. Mas ele não soube dizer quando e qual era o local em que trabalhou. Em outra ocasião, para os moradores do sítio, disse ainda que se chamava Biliteco. Até hoje, este é um dos modos pelo qual é identificado.

Moradores do local afirmam nunca terem visto algo do gênero (Foto: Luiz Felipe Leite/G1)Moradores da região afirmam que nunca viram algo
parecido no canavial  (Foto: Luiz Felipe Leite/G1)

Rotina é tranquila
Segundo Sérgio Rubia, empresário de
Rio das Pedras (SP) e amigo da família proprietária do sítio, o ermitão tem um temperamento tranquilo e não incomoda ninguém. “Ele chegou do nada. O pessoal pensava que ele era andarilho, mas foi ficando e está aqui há quase três décadas. Já enfrentou frio, chuva e incêndio de cana. Nunca o vimos doente ou soubemos que ele tenha ateado fogo”, relatou o empresário.

Moradores do sítio
Segundo o dono do sítio onde o ermitão vive, que pediu para não ser identificado por temer que a propriedade da família há mais de cinquenta anos vire “ponto de romaria”, a rotina do homem é a mesma ao longo desses anos. “Ele levanta por volta das 6h, deixa seu 'ninho', como chamamos a cama feita de palha e retalhos onde ele dorme no meio da cana, e vem para a casa da minha mãe. Aqui ele toma café com leite e come um pedaço de pão”, disse o proprietário.
Após o café da manhã, o eremita caminha pela propriedade da família. Às vezes sai no início da manhã e volta apenas no começo da noite. “Quando ele quer comer, ele vem aqui. Nós damos camisa e calça a cada três meses, que é o tempo da roupa até estragar. Banho, sinceramente, nunca vi ele tomar”, contou o proprietário do sítio.

Moradores do local afirmam nunca terem visto algo do gênero (Foto: Luiz Felipe Leite/G1)Figurino do ermitão é composto de roupas velhas, guarda-chuva, sacola e chapéu (Foto: Luiz Felipe Leite/G1)

Isolamento do capitalismo?
Um ermitão ou eremita é um indivíduo que, por penitência, religiosidade ou por simples amor à natureza, vive em lugar deserto e isolado. Segundo a professora de sociologia da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), Selma Zenco, diversos motivos podem explicar o porquê do isolamento de Biliteco.
“Podemos enxergar esse caso de diversas formas. Ele pode estar atrás de uma fuga do sistema capitalista, não sentindo falta da lógica consumista da nossa sociedade”, explicou a professora. Ainda segundo ela, o indivíduo em situações como a do eremita de Capivari se isola não só geograficamente, mas pessoalmente. “Ele não divide perspectivas e se fecha em si mesmo.”
Casos como o de Biliteco são raros, pois a fuga da sociedade é algo muito difícil de acontecer, segundo Selma. “A própria sociedade nos empurra para o sistema capitalista", encerrou.

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